Estou a escrever pela primeira vez para o Aragem. Sou a Avó Pirueta, tão simplesmente. Tenho que começar por agradecer o convite para participar mas fico um tanto envergonhada com a saudação de boas-vindas com que o José Matias me apresenta. De facto, e muito sinceramente, fico sempre admirada por as pessoas darem tanta importância a pequenas coisas que faço. Por isso, queria desde já esclarecer quem me começar agora a conhecer que tudo o que tenho feito na minha vida, se ajudou outros, ajudou-me primeiramente a mim própria.
Não sou angolana, nem moçambicana, sou, antes de mais nada, uma cidadã do mundo que tem uma costela profundamente africana. Algo em mim me empurra para África e não há dúvida de que África exerce sobre mim uma atracção difícil de gerir.
Como Professora, pois vou sê-lo toda a vida, enquanto tiver um cérebro que funcione, e falando de Angola e Moçambique, foram espaços em que me senti completamente realizada. A Educação, representada pela Escola, apresenta-se-nos aí com toda a sua importância. O que se faz são milagres, muitas vezes improvisados (quase sempre, para ser mais franca). Mas os milagres não resolvem problemas de fundo. Aliás, milagres é coisa que não me seduz por aí além, e estou muito bem acompanhada: Jesus não gostava nada que lhe pedissem milagres...
Bem,´Angola e Moçambique têm uma imensa população infantil e juvenil. A maior parte sedenta de aprender. Não me vale de nada dizer que Angola é muito rica. Não é o dinheiro que prepara Professores, é o Tempo e bons Mestres. Há uma grande carência de professores bem preparados, sim, mas também de manuais escolares adequados à realidade local. Até o vocabulário deve ser bem estudado. Porque para aprender, nos primeiros anos, e especialmente no interior, serve qualquer árvore que proteja do sol...
Não é por tudo isto, contudo, que alguma vez deixarei de me interessar pelo que se passa na Escola em Portugal. Sou, nesse campo, bastante crítica sempre que não se faz o possível. E não me estou a referir só aos professores: na Quinta-feira, em Lamego, ouvi uma conversa de rua entre duas mães. Relativamente jovens. E dizia uma delas: "A minha filha, coitadinha, lá foi hoje para o liceu! A primeira vez! Vinha assustadita, coitadinha! É muita coisa, muitos livros, muitos trabalhos! Deus queira que ela se dê bem!"
É claro que a coitadinha não se vai dar bem! Cada vez que não se apetecer trabalhar, basta arranjar uma carinha preocupada (à porta de casa), dizer que está cansada, que tem muito que estudar. E aquele mãe amantíssima irá a correr mandá-la sentar-se no sofá, levar-lhe o lanchinho num tabuleiro e dizer que descanse. Ora bolas! Estudar é algo que Pais e Professores (as minhas maiúsculas são sempre intencionais e significativas) devem estimular como uma tarefa que nos ajuda a crescer. Não é uma penitência, é uma oportunidade! Por cada menino mimado que acha que a Escola é uma chatice, há centenas, para não dizer milhares, de meninos para quem a Escola é um sonho, uma miragem.
Fico por aqui. Na próxima darei exemplos mais concretos. Porque gosto de chamar as coisas pelos nomes.
6 comentários:
Cara Avó, não nos conhecemos, mas este seu texto de estreia soou-me a "coisa próxima", pensada por dento de mim e sentida em consonância. Volte sempre. Abraço, Cristina Gomes da Silva
Cara Carmo, cara Avó Pirueta
(Não sei como prefere - como preferes, se nos pudermos tratar por tu, acho que não tem jeito cerimónia entre avós)
Mesmo sendo também avó e aposentada, suspeito que continuo a ser o elemento mais velho, perdão, menos jovem aqui do nosso Aragem, por isso não devo deixar de me apresentar. É que isto de ser avó é uma coisa para ser apregoada, sobrepõe-se a qualquer modéstia ;)
Mas falando agora mais a sério: eu não conheço África ao vivo, mas tocaram-me essas palavras que sei que dizem uma verdade: "Por cada menino mimado que acha que a Escola é uma chatice, há centenas, para não dizer milhares, de meninos para quem a Escola é um sonho, uma miragem." Se eu ainda estivesse na escola, ia transmitir isso a alguns meninos (embora não tenha tido razão de queixa, não me lembro de ter tido muitos desses meninos mimados, mas não deixei de ter alguns).
Ai Avós... sabe bem ouvir-vos. Beijinhos doces (mais de filha crescida que de neta :)
Sem dúvida que este espaço colectivo ficou mais rico. Renovo votos: bem-vinda, tu que vens por bem.
Espero que a Carmo não se importe que nos tuteemos :) Bem-vinda, Carmo.
Ao contrário da Isabel, eu suponho ser a mais nova do grupo... sedenta de aprender... e devo dizer que as suas palavras, hoje em particular, me estimularam para mais uma noite de trabalho!
Saí da escola emocionalmente de rastos... com a falta de vontade de trabalhar dos alunos mas sobretudo com uma política de escola feita em cima do joelho... Desiludida, tenho hipótese de atirar resmungos para a blogosfera sem nada fazer ou então posso e devo tomar posições claras, consonantes com o meu espírito crítico e pouco passivo.
Obrigada por esta maravilha "Por cada menino mimado que acha que a Escola é uma chatice, há centenas, para não dizer milhares, de meninos para quem a Escola é um sonho, uma miragem."
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