quarta-feira, abril 29

Articulação curricular.

1. Sou um adepto activo da articulação curricular porque o conceito está impregnado na minha concepção de escola e na minha percepção de profissionalidade docente.
2. À articulação curricular subjaz uma ideia de colaboração e de colegialidade. Não me refiro a uma colaboração qualquer, a uma colaboração que divide, a uma colaboração artificial típica da balcanização do ensino.
3. A articulação curricular não emerge por decreto ou por determinação superior. A articulação curricular resulta de uma cultura de escola assente na confiança nos processos e nas pessoas.

Pergunto se é possível uma articulação curricular genuína nesta escola fabril idealizada pela equipa governativa que prefere adoptar formas paternalistas de confiança?

sexta-feira, abril 17

Já pensaste que...

Já pensaste que...

Já alguma vez pensaste
que é bom ter olhos
para ver o mundo

e ouvidos
para ouvir os outros




e boca
para dizer tudo aquilo
que dizemos






e pernas
para nos levar
onde somos precisos







e mãos
para ajudar
os que delas precisam






e braços
para estreitar os outros
num abraço


e ombros
para que alguém neles
recline a cabeça fatigada





e cérebro
para pensar em ajudar os outros

e coração
para sentir as coisas
que nem sempre compreendemos
imediatamente.







Já alguma vez pensaste
como tudo isto é maravilhoso?
___________
Leif Kristianson
Via Clube dos contadores de histórias

sexta-feira, abril 10

Aprender e Ensinar

« 150 treinos mais 20 a 25 jogos por ano, de novo dispondo de total autonomia na direcção e condução da actividade, a significar terreno profícuo ao desenvolvimento, é no nosso olhar sobre o jogo que começa por ocorrer a mudança.
E o que começa a ocorrer, é que, progressivamente, o olhar na busca dos caminhos para ensinar, vai-se libertando da exclusiva conformidade com os conteúdos, para deslizar na identificação dos problemas que a situação de jogo colocava aos aprendizes.
Aprendemos a olhar não para o jogo, mas sim para o jogo que eles conseguiam jogar, focalizando o olhar nos expedientes de que se socorriam para resolver os problemas, para daí avaliarmos o nível de competência necessária para poderem ter êxito.
E fomos aprendendo que tínhamos de ser capazes de ver o jogo simultaneamente em duas dimensões. A dimensão real, que se traduzia naquilo que estava a acontecer, e a dimensão antecipativa, que se traduzia naquilo que deveria acontecer.
Situando-nos sempre entre o jovem e o jogo, fomos naturalmente percebendo que cabe a quem ensina adequar as condições de prática, quer às particularidades dos praticantes (competências que possuem), quer aos propósitos da aprendizagem (conseguir que joguem).
A experiência de Moçambique ensinou-nos a compreender que se aprende enquanto se ensina, e ensinou-nos a saber procurar mais com a aprendizagem do que com o ensinar.”

Hermínio Barreto (2004) Prontidão desportiva. Equilíbrio entre as capacidades de hoje e exigências de amanhã. In: Gostar de Basquetebol. Ensinar a jogar e aprender jogando (pp 19-20). Lisboa: Edições FMH.

Feliz Páscoa! ;)

quarta-feira, abril 1

... nunca precisámos de outra coisa!

Estive (sexta-feira passada) num jantar da minha antiga escola...
O António Pinto Basto (amigo de uma colega) foi o "animador"... cantando...
No final, alguém lhe pediu para recitar um "certo poema"...

Ele não se fez rogado... e é indizível a extraordinária forma como declamou esta peça de rústica e fedorenta poesia (atenção: fê-lo de cor, como intigamente!)... explicando-nos que o poema havia sido escrito pelo seu avô para um certo jantar onde iria estar presente o ministro da Agricultura de então (1934). Confesso que não acreditei... mas depois descobri o que vão escutar e acho que deve ser verdade...

Sim, eu sei, sou garota delicada e tal, dada a poesia refinada, muita cultura e borboletas, flores de jardins e coisas afins, mas... tenho o meu lado rabino, acreditem, embora o mantenha sob controlo. A verdade verdadinha é que chorei a rir (tenho de vos confessar esse pecado, meus caros confrades, não obstante toda esta minha refinada delicadeza que perdeu ali momentaneamente toda a sua compostura).
Devem ser os nervos, o stress e a falta de sorrisos pela escola... Uma certa urgência de rir... A culpa não pode ser minha. Estou certa. :)
Aliás... bem vistas as coisas não confesso nada e como hoje é dia 1 o blogger vai mentir colocando o meu nome na assinatura.

Acabei de encontrar na 'net o tal poema (está em imensos locais... não revelo as palavras que usei para o encontrar... e até descobri alguém a declamá-lo! ;). O confrade-mor atestou da qualidade poética para integração nesta Aragem, hoje fortemente adubada com o meu singelo e estranho contributo...

Sei que logo logo alguém vai conseguir elevar acima do solo a escatologia das palavras aqui partilhadas neste momento. Mas embora a agricultura seja uma coisa que começa rente ao chão... sem estrume não pode dignar-se a olhar o céu.
Uma boa Páscoa para todos!

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O Texto é dedicado a Leovigildo Queimado Franco de Sousa, na época, Ministro da Agricultura, e antepassado da actriz portuguesa Barbara Norton de Matos. O Texto é fundado nas queixas dos agricultores.
http://osveencidosdavida.blogspot.com/2008/01/salazar-o-outro-retrato.html



Porque julgamos digna de registo
a nossa exposição, senhor Ministro,
erguemos até vós, humildemente,
uma toada uníssona e plangente
em que evitámos o menor deslize
e em que damos razão da nossa crise.
Senhor: Em vão, esta província inteira,
desmoita, lavra, atalha a sementeira,
suando até à fralda da camisa.
Falta a matéria orgânica precisa
na terra, que é delgada e sempre fraca!
- A matéria, em questão, chama-se caca.


Precisamos de merda, senhor Soisa!…
E nunca precisámos de outra coisa.


Se os membros desse ilustre ministério
querem tomar o nosso caso a sério,
se é nobre o sentimento que os anima,
mandem cagar-nos toda a gente em cima
dos maninhos torrões de cada herdade.
E mijem-nos, também, por caridade!


O senhor Oliveira Salazar
quando tiver vontade de cagar
venha até nós solícito, calado,
busque um terreno que estiver lavrado,
deite as calças abaixo com sossego,
ajeite o cú bem apontado ao rego,
e… como Presidente do Conselho,
queira espremer-se até ficar vermelho!


A Nação confiou-lhe os seus destinos?…
Então, comprima, aperte os intestinos;
se lhe escapar um traque, não se importe,
… quem sabe se o cheirá-lo nos dá sorte?
Quantos porão as suas esperanças
n’um traque do Ministro das Finanças?…
E quem vier aflito, sem recursos,
Já não distingue os traques dos discursos.
Não precisa falar! Tenha a certeza
que a nossa maior fonte de riqueza,
desde as grandes herdades às courelas,
provém da merda que juntarmos n’elas.


Precisamos de merda, senhor Soisa!…
E nunca precisámos de outra coisa.


Adubos de potassa?… Cal?… Azote?…
Tragam-nos merda pura, do bispote!
E todos os penicos portugueses
durante, pelo menos uns seis meses,
sobre o montado, sobre a terra campa,
continuamente nos despejem trampa!
Terras alentejanas, terras nuas;
desespero de arados e charruas,
quem as compra ou arrenda ou quem as herda
sente a paixão nostálgica da merda…


Precisamos de merda, senhor Soisa!…
E nunca precisámos de outra coisa.


Ah!… Merda grossa e fina! Merda boa
das inúteis retretes de Lisboa!…
Como é triste saber que todos vós
Andais cagando sem pensar em nós!
Se querem fomentar a agricultura
mandem vir muita gente com soltura.
Nós daremos o trigo em larga escala,
pois até nos faz conta a merda rala.


Venham todas as merdas à vontade,
não faremos questão da qualidade.
Formas normais ou formas esquisitas!
E, desde o cagalhão às caganitas,
desde a pequena poia à grande bosta,
de tudo o que vier, a gente gosta.
Precisamos de merda, senhor Soisa!…
E nunca precisámos de outra coisa.

João Vasconcelos e Sá (será?)

1934



http://cgmkt.wordpress.com/2008/11/23/poema-a-ministro-de-salazar/
http://senderosdereflexao.blogspot.com/2008/10/poema-dirigido-um-ministro-de-salazar.html
http://ferrao.org/2008/09/dom-tranquedo-pedido-de-adubos.html
http://opafuncio.blogspot.com/2008/09/exposio-sindical-em-tempos-de-salazar.html
http://hortademilfontes.blogspot.com/2008/02/h-falta-de-adubo.html
http://www.misturagrossa.net/index.php?s=reina%C3%A7%C3%A3o
http://seralentejano.wordpress.com/2008/02/20/no-tempo-do-salazar/

etc. ...

Difícil e fácil...

É mais difícil ser livre do que puxar uma carroça.

Vergílio Ferreira

(Roubado AQUI)