domingo, janeiro 2

A Esperança Tem de Começar no interior de nós mesmos

Finalmente aqui venho para inscrever a tese que está no título. Isto é, temos de querer e crer no nosso poder de reconstrução dos nossos pequenos mundos. Tendo dito e escrito que os professores têm mais poder do que o que pensam possuir. E podem mobilizá-lo para essa reinvenção de dias mais claros. São, certamente, pequenos poderes. Mas que farão toda a diferença para muitos alunos e colegas de ofício.
E Bem precisados estamos. Porque é ilusório pensar que será o sistema que nos trará respostas para os problemas. O sistema só nos anuncia mais problemas: mais tempo de trabalho, menos remuneração, mais conflitualidade, menos, mais... numa contabilidade desastrosa.
E, neste cenário, teremos encontrar dentro de nós e na relação com os nossos pares novas formas de tecer a esperança em melhores dias.

sábado, janeiro 1

A Esperança começa por acreditarmos nas crianças/alunos

Via referência do JMA no Terrear, trago para aqui uma parte de um relato de uma professora no Vox Nostra. E o que eu gostaria de deixar dito neste primeiro dia do Novo Ano, é dito no último parágrafo por essa professora. Porque acredito convictamente que todos os alunos são capazes de aprender, podendo é ter as aptidões escondidas ou bloqueadas, e que mesmo os que parecem não querer, lá no fundo gostariam de aprender.

(...)

Sou professora de uma turma Ninho do 8º ano, e quando o Ninho foi formado no início do ano, a professora titular forneceu-me algumas informações relativamente aos quatro alunos que iriam ficar comigo. O C. foi o aluno que me chamou mais à atenção, não só porque, segundo a colega, era um aluno com imensas dificuldades de concentração/ atenção, de aprendizagem, mas sobretudo com dificuldades de relacionamento. Logo na primeira aula, o C. isolou-se na sala (e a sala é bem pequena), mal levantava a cabeça, mal respondia às minhas solicitações, era introvertido, e quando os colegas falavam com ele, ele simplesmente ou não respondia, ou dizia qualquer coisa “entre dentes”, imperceptível. Percebi mais tarde que não gostava de aulas, e estava ali por obrigação. Sempre que eu ia para as aulas, pensava numa forma de motivar o C., mas infelizmente saia sempre com um enorme vazio, fracasso, e incapacidade de lidar com este desafio. No entanto, eu continuava a acreditar…
O primeiro conteúdo programático a ser leccionado no 8º ano, e em termos de revisão/ consolidação, foi o texto poético. Todos nós sabemos a dificuldade que existe em conquistarmos os alunos com este tipo de texto, porém, é para mim um prazer enorme “inventar” estratégias/ actividades para os cativar e levá-los a gostar de poesia. Só que nenhuma delas funcionava com o C., e ele continuava no seu canto, em silêncio, no seu mundo. Inesperadamente, e sem pensar em qualquer tipo de intenção, comecei a reparar que nalgumas aulas, o C. fazia uns “rabiscos” no seu caderno. E numa aula, aqui sim, intencionalmente, e a propósito de uma poesia de Eugénio de Andrade, “Paisagem”, perguntei ao Ninho quem sabia desenhar. O C. levantou a cabeça, os colegas responderam de imediato: “O C. stora!”. (Confesso que era esta a reacção que eu esperava). Ele olhou para mim, e eu perguntei: “Queres ir ao quadro C.? Quero desafiar-te.” Incrédula, vi o C. levantar-se, dirigir-se ao quadro, e agarrar na caneta que estava na secretária. “Que quer que eu faça, stora?”, perguntou ele. Senti uma alegria interior. O C. estava a ter um diálogo comigo! E foi aí que o desafiei: “Quero que pintes o poema que os teus colegas acabaram de ler. Vou pedir-lhes para lerem o poema devagar, e tu vais desenhando o que ouves.” E assim foi. Começou a desenhar, cada linha, cada verso, cada imagem que ia “ouvindo”. E nós, cá atrás, estávamos sem palavras. Sem reacções. Apenas olhávamos, em silêncio, cada traço, cada curva, cada figura do C.. E no final, todos aplaudimos. Eu, com uma enorme satisfação, abracei-o, e tirei uma fotografia da “pintura”. O C. sorriu, agradeceu, e manteve o mesmo sorriso até ao final da aula. A partir desta aula, a atitude do C. mudou completamente. É o primeiro a chegar à aula, quer participar, ir ao quadro, tomar apontamentos no caderno diário, e até escrever. Sim, ele escreveu um poema!
(...)
É com esta “história fantástica” e exemplificativa, que pretendo mostrar a todos (as) os (as) colegas que é possível acreditar, mesmo quando pensamos que não vamos conseguir. Não desistam. Dentro de cada aluno, há uma resposta e um sinal, mais precisamente uma chave, para chegarmos até eles. Sucesso não é só levá-los a atingir resultados, é sobretudo levá-los a ganhar confiança neles próprios, e levá-los também a acreditar que são capazes de conseguir.