Transcrevo a opinião e o desafio da nossa confrade (IC)Isabel Campeão (sublinhados meus):
"(...) o tema deveria ser retomado depois, talvez subdividido, um aspecto de cada vez desse "programa provisório" que o José Matias traça. Continuo a pensar (como de certo modo já apelei em comentário no Aragem) que partilhas de práticas concretas não são modos de cada um 'exibir' o que faz, mas sim trocas de ideias/experiências, bem sucedidas ou até mal sucedidas, e é também na troca/partilha que o professor se forma e cresce. Enunciar é mais fácil, como pôr em prática o que se enuncia já não é tão evidente como parece, e eu perfilho a ideia de que a partilha e alguma discussão de práticas concretas é o mais enriquecedor na blogosfera para todos os que leiam (sem querer estar a fazer propaganda, o Tempo de Teia da 3za é, a meu ver, um bom exemplo dessa partilha espontânea e enriquecedora de nós todos). Mas, sim, acho que seria de aproveitar bem, no Aragem, este resto de semana do tema, e a semana é sua José Matias, permite-me o atrevimento de apelar (na minha qualidade de elemento do Aragem) a que "pique" para que o debate não esmoreça como já se está a sentir? (embora tenha suscitado muitas e pertinentes/importantes intervenções)"
Impossível ficar indiferente. Este pode ser, de facto, um caminho. Partilhar o que se faz e parece resultar (ou mesmo não resultar): Coisas simples, óbvias, que às vezes até nos inibimos de referir ou contar. Aproveitar o resto da semana para isso... (ou mesmo voltar depois, sistematizando as tais alíneas do "programa provisório").
Relato uma prática (que este ano não estou a seguir) mas que adoptei vários anos (e à qual poderei voltar). Cada aula (de Português) começa com a declamação de um poema escolhido à vez pelos alunos; o poema está também escrito numa folha e desejavelmente ilustrado. Depois de declamado é brevemente comentado e afixado no painel da sala. No final do ano, os alunos escolhem o poema de que mais gostaram/que foi mais bem dito. E o autor recebe uma lembrança. Treinar (e valorizar) a prática da memorização; mostar que a poesia é ritmo, música, jogo. Expressão e invenção.
Ou então uma outra que mantenho: cada turma tem um caderno. Cada aluno escreve um texto da sua autoria e lê na aula seguinte. O caderno passa de mão em mão. O professor recolhe o caderno de vez em quando e comenta - em regra valorizando e incentivando...- cada um dos textos. Há exemplos espantosos de mestria na produção de alguns textos. Uma forma de dar/ter voz no 'capítulo'...
20 comentários:
Hummm… práticas concretas? Na realização de um torneio de futebol (futsal) inter-turmas, procuramos envolver alunos na sua organização. São cerca de dez, doze, alunos que participam nas deliberações dos conflitos disciplinares, em plenário. Cada aluno é convocado a pronunciar-se sobre a ocorrência e lança uma proposta de resolução. Como é evidente, cada ocorrência mais ou menos grave é sempre ma oportunidade para perceber quadros de referência…
Parece quase nada. Mas é tudo. Faz lembrar o Ulisses de Fernando Pessoa:
O mito é o nada que é tudo.
O mesmo sol que abre os céus
É um mito brilhante e mudo -
O corpo morto de Deus,
Vivo e desnudo.
Este, que aqui aportou,
Foi por não ser existindo.
Sem existir nos bastou.
Por não ter vindo foi vindo
E nos criou.
Assim a lenda se escorre
A entrar na realidade,
E a fecundá-la decorre.
Em baixo, a vida, metade
De nada, morre.
Uma prática bem sucedida e da qual me orgulho muito: http://ctdesportovizela.com.sapo.pt/
Aqui vai uma nota mais relacionada com a Matemática (a disciplina em que, julgo, é mais frequente o aluno não estar a perceber e não o dizer), mas que também terá o seu cabimento nas outras disciplinas.
Quando recebia uma nova turma, a minha primeira prioridade era convencer todos de que ter dúvidas, errar e ter dificuldade em perceber era muito natural, não significava falta de inteligência, e que uma condição muito importante para serem bem sucedidos era não calarem as dúvidas e dificuldades.
Ora, isto será preocupação de qualquer professor. Mas, por vezes, pensa-se que basta fazer aquelas recomendações à turma.
Não basta, não. Os alunos mais novos trazem o receio da troça ou do que pensarão os colegas; a ideia, nos mais novos e nos do 3º ciclo, de que insistir em que não estão a perceber bem é inferiorizante, é uma ideia que está muito arreigada; também é comum a ideia do próprio aluno "eu para a Matemática não dou" (julgo que, noutros, será para outra disciplina, ouvi-o bastantes vezes referindo-se o aluno às línguas estrangeiras), o que leva a uma desistência como quem acha que nem vale a pena pôr dúvidas.
Por tudo isso, eu não me limitava a uma conversa e respectivas recomendações. Seguia uma certa estratégia deliberada durante umas tantas aulas, e não eram três ou quatro que bastavam. Instalar a naturalidade da parte de todos nos repetidos braços no ar, chamadas dos grupos ou individuais, não ficarem pelo "percebi mais ou menos", criar um ambiente de confiança e à-vontade no perguntar, entenderem que a boa relação com a matemática passa pela naturalidade do erro, das dúvidas e das dificuldades, enfim, conseguir isso requer um certo tempo e aproveitamento de situações que desinibam todos.
Como já disse, não duvido que isso seja preocupação de qualquer professor (a menos que se trate de caso em que a profissão é uma maçada). Mas não é demais repetir que, para bastantes alunos, não basta o professor recomendar que coloquem as suas dúvidas. Alguns não colocam, fica para nós reparar nos olhares e nas expressões, provocar situações em que acabam por ter que revelar que não estão a perceber ou a perceber bem e tranformá-las em situações que dêem a todos confiança, que a todos tirem esse receio de parecerem "burritos".
Em suma, eu não me ficava por recomendações, seguia, de certo modo, um plano (que incluía verificarem que a minha prática correspondia mesmo ao que dissera), até ter estabelecido esse ambiente que queria - e ele acabava por se estabelecer, o que é uma memória grata para mim.
Oh IC! Somos gémeas... :)
Descreveste uma das práticas que considero fundamentais e que é o meu pilar, a minha trave-mestra.
(Poupaste-ne tempo... eh eh eh, que é coisa que por aqui não abunda...)
Só para concordar. Cheguei até a instituir a obrigação de, à vez, cada aluno apresentar em cada aula uma dúvida. Se não tinha era obrigado a inventar...
Podia dar alguns exemplos mas escolho este: pedir aos alunos que escrevam a sua própria biografia na terceira pessoa, respeitando as regras que normalmente seguem para a apresentação de um grande autor, um fantástico cientista, um maravilhoso matemático. Estão a imaginar a maravilha de textos que surgem a maior parte deles sem preocupações de limites de linhas e o entusiasmo depois no seu aperfeiçoamento. Pedir depois aos alunos, conhecidos os parâmetros de avaliação da leitura oral, que os leiam para o meu gravadorzinho mp3 (que é isso "stora? ah tão giro esse microfone que prendemos na t-shirt :-) )e que depois se avaliem a si mesmos e avaliem os outros e que depois melhorem. Resumindo... não há ninguém distraído, pelo contrário saio da aula estafada com tanto entusiasmo. Depois vamos publicá-los na página da turma. Esse e outros trabalhos que a net permite divulgar e que só por isso já merecem o melhor que os alunos dão.
Ontem o melhor texto e a melhor leitura foi da C. descrita como "muito fraquinha" e a precisar de apoio no CT do ano passado. Adoro estas mudanças, adoro o que faço!
ooooppssss lá vem a "paixão segundo 3za", desculpem!
Muitas destas pequenas (enooooomes) práticas estão dependentes da personalidade de cada professor. O que enriquece a aula e a torna única, acredito eu.
Sempre apostei em saber os nomes dos alunos a uma velocidade que os espantava. Esforçava-me, quando deixava a aula, por memorizar os nomes. E, na segunda aula, dirigia-me a alguns deles tratando-os pelo nome próprio. Sobretudo aos que eu próprio tinha sentido como mais tímidos, menos seguros, mais necessitados...
Recorro sempre ao humor. Muito.
Valorizo os mais minúsculos avanços... desmistifico falhas. Encorajo.
Na entrega das provas escritas, valorizo as respostas certas. Escrevo comentários em resoluções que indicam que o aluno progrediu...Quando o tempo permitia, fazia testes em duas fases. Penso que sabem de que se trata.... e resultava. Muito bem, aliás.
Tento estar atento à vida fora das paredes. Cheguei a falar com pais de alunos geniais - preocupavam-me, muitas vezes. Tanta dedicação APENAS à escola podia revelar algo de grave.
Sei lá eu que mais... encarar o aluno, a gente que lá mora, e não o número que traz associado, naquele ano lectivo. Sempre professor... depois, muitas vezes e de muitos ex-alunos, mais um amigo.
No teste da milha do Fitnessgram (uma bateria de testes que visa avaliar a aptidão física associada à saúde) a aluna não se resignou com as dificuldades de mobilidade provocada pelos seus desmesurados seios. Marchou, correu sem a ajuda dos braços que, enlaçados, procuravam minimizar o desconforto. Não procurou um pretexto para desistir. Foi a prova mais demorada da turma. Foi a melhor prova da turma.
Muito dependente do amor ao saber e do amor ao outro. Da esperança e da confiança. Como poderia dizer o Ramos Rosa: "Nós somos a pedra piramidal...."
Desculpem o desabafo mas.... este post e os comentários que está a provocar - quero mais, quero que leiam, quero que partilhem, está a ser um dos melhores pelo fenomenal aspecto prático de que se reveste. tenho recebido este ano vários pedidos de ajuda de uma colega que esteve o ano passado dispensada da componente lectiva. Este ano tem 2 sétimos e um terceiro de currículo alternativo. Como, além disso, sempre se escusou à correcção de exames e precisa de se familiarizar com a avaliação criterial de competências, está um pouco aflita. Tenho partilhado tudo o que está ao meu alcance e cada vez mais me convenço que só num clima assim é que o ensino (e consequentemente a aprendizagem) podem melhorar. Já agora, estratégias para aumentar o número de leitores aqui do cantinho? Já o mostrei numa reunião de departamento. Amanhã quero ver se o afixo na sala de profes ;-) mais.....?
Minha cara profª Teresa. Quem me dera ter a receita. Mas mesmo «não tendo» idade para ser avô, arrisco dizer: aumentamos a partilha quantos mais de nós perderem o 'medo' do outro; ganharem mais auto-estima; sentirem o prazer de dar; se elogiarem uns aos outros; sublinharem MAIS o que nos une do que o que desune (e nos destrói)... ; lançarmos o desafio e a semente. Tenho a certeza que o movimento vai crescendo...
Teresa:
Não tennho acesso à estatística das visitas a este cantinho (o Miguel deve ter), mas pelo que vejo no meu, há sempre consideravelmente mais visitas do que comentários (embora haja que ter um site de estatística que dê pormenores, pois também muitas pessoas vêm parar a um blog por pesquisa de temas no Google, não encontram o que procuram e demoram um segundo). No entanto, apesar de já haver bastantes professores com blogue ou frequentadores da blogosfera, tenho a percepção, pelos professores que conheço, que é ainda uma percentagem ínfima. Acho que fazes bem e todos fariam bem em divulgar, não necessariamente o Aragem ou o próprio blogue, mas a blogosfera dos professores como um espaço de comunicação, troca de ideias e até informação actualizada sobre a política rducativa. Com as tarefas da escola, cada vez mais tarefas burocráticas, os tempos de discussão, nomeadamente nas reuniões de departamento e outras, são cada vez mais reduzidos, pelo que a blogosfera se está a tornar um espaço importante que é pena não ser aproveitado por mais professores.
Quanto a partilhas de natureza prática, acho que este post do JMM deu um pontapé de saída, e o que é preciso (a meu ver) é perder a ideia de que não vale a pena ou que são descabidas e retomar isso mais vezes ao longo do ano - sistematizando as ideias do "programa provisório" que o JMM enunciou, como o própri sugeriu.
E vá... venham mais achegas! ;) (Ainda não veio nenhuma a contar algo que não resultou, com o que também se aprende - e lá estou eu a "provocar" :) :) )
Apesar de nunca ter comentado há já algum tempo que sou leitora assídua deste blogue e confesso que a vossa partilha de experiências me provoca o desejo de cada vez fazer mais. Também percebi que afinal não ando sozinha a sonhar/lutar pelos nossos alunos.
Acredito que é isto que faz falta nas escolas. Menos reuniões cujo único objectivo é preencher papeis ou falar sempre do mesmo (chegam a ser 20 reuniões por período, quando se tem muitas turmas) e mais partilha de experiências práticas. Achei extremamente interessante e proveitosa a ideia dos poemas, uma bela maneira de iniciar uma aula de Português.
Nós temos um poder que não imaginamos. Por exemplo, persuadir a que nas reuniões de departamentos pelo menos metade do tempo seja dedicado à partilha de práticas, dúvidas, (in)sucessos (sem ultrapssar o limite temporal da reunião); nas reuniões de CTurma haja sempre uma questão pedagógica para debater/confrontar/; fazer parar as reuniões improdutivas (au-decretar normas que sigam neste sentido...); forçar a que o Tempo não Lectivo seja usado para momentos de trabalho comum (e não seja o trabalho esmigalhado e solitário que muitas é...); inventar, imaginar, mudar a vida que nos afixia (muitas vezes sem nos darmos conta....)
1º)Os meus alunos têm falta de material quando levam um sorriso para a aula, partindo daí trabalhamos a tenue fronteira entre a boa disposição e o "descarrilamento comportamental"...a dificuldade incial transforma-se em algo produtivo que acaba por marcar alguns.
2º)Como director de turma nunca informo o EE dos episódios que acontecem, os alunos é que o fazem e sabem que os EE, devem de me telefonar para dar conta da conversa entre "pai e filho", os resultados têm sido óbvios com v+arios testemunhos spoisnfo a medida que vai muito para além de um diálogo disciplinar entre os intervenientes. Desta forma passo a ser como o árbitro ideal, passo despercebido, tão despercebido que já tive necessidade de convocar uma reunião para alertar da necessidade dos pais não deixarem tudo para mim. ah, tenho 100% de assiduidade dos EE às reuniões (quando não acontece, tenho um telefonema a justificar tal falha) tudo porque na primeira convocatória digo abertamente "se voce não vier aqui vou eu aí"....
enfim pouco me interessa qualificar erstas práticas, têm muito a ver com a minha personalidade e o importante é cada professor adaptar a sua personalidade à melhor prática que por muito boa que seja pode não encaixar como deve ser na personalidade do colega ao lado...
Claro, mas são as diferenças, os contextos, as circunstâncias que podem exigir ou possibilitar as boas práticas que refere. Nada como definir regras, implicar as pessoas no jogo, responsabilizá-las... É isso, aí.
Aqui há uns anos estive numa turma de 7º com 27 alunos, salvo erro, onde iam reprovar cerca de 17 no fim do ano. Como assumi que aquela situação tinha sido criada pelo facto de a turma em si ser reprovogénica(era muito grande e constituída por muitos alunos já repetentes e juntos em anos anteriores por causa de experiências com turmas ditas de nível), achei que tinha de fazer qualquer coisa. Inventei um projecto e disse aos meus colegas que para o aplicar no ano seguinte devíamos dar uma oportunidade de passagem de ano aos alunos que estavam para reprovar. Os meus colegas engoliram a receita, pois só ficaram retidos 1 ou dois já nem me lembro bem. Depois fiz um pouco de missionário, fazendo tudo aquilo que uma escola e os pais deveriam fazer e não fazem habitualmente por falta de conhecimento, capacidade ou recursos. Tive de lutar até contra muitas resistências dentro da escola, pois não tive facilidades nenhumas. Os próprios colegas novos que apareceram de novo no 8º e no 9º tinham de ser socializados no processo. No fim do 9º ano só mais um ficou pelo caminho. Para mim foi uma experiência fantástica que pagou todo o esforço que fiz.
O mais engraçado é que eu nem sequer era o DT, o que até foi uma vantagem pois eles tinham um DT administrativo e pedagógico e depois um tipo como eu.
No ano seguinte integraram-me numa turma de curriculo alternativo com 15 alunos escolhidos a dedo e com o conselho de turma com confdições de horário etc especiais. Aquilo deu para o torto e no nono só restaram 3.
Da experiência 1ª escrevi um artiguito ingénuo para a revista "O professor" que saiu no nº 57, Out Nov de 1997.
Resta dizer que eu sou contra turmas de nível, turmas de curriculo alternativo e coisas que tais. O que não quer dizer que seja contra alternativas curriculares, para todos os alunos.
Uma das principais dificuldades da perspectiva construtivista é a de conjugar a necessidade de trabalhar a zona potencial de desenvolvimento, através do trabalho de grupo ou de pares e a internalização. Ambas exigem tempo e que demos aos alunos a possibilidade de o gerir. O equilíbrio torna-se mais difícil quando conjugamos numa só actividade os dois objectivos: trabalhar a zona de desenvolvimento potencial e a internalização. Como costumo trabalhar estes dois objectivos e procuro optimizar o tempo que lhes destino, uma das formas que tenho de o fazer é que os alunos trabalhem os conteúdos em diálogo oral e escrito, em que estabeleço tempos para a realização de tarefas. Antes da execução, definimos os objectivos das tarefas e apontamos a percepção de auto-eficácia de cada aluno/ par/grupo. Depois de apresentar o seu trabalho, cada aluno/par/grupo avalia, através de uma escala simples, tipo bem executado/mal executado ou muito bom/bom/suficiente/insuficiente.
Depois, peço aos alunos que comparem as estratégias utilizadas e apuramos quais as estratégias que conduziram a melhores resultados. Assim escrito, até parece muito complicado, mas como, de cada vez, coloco em comparação não mais de 4 casos, faz-se rapidamente.
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